A vida por um fio

O frio gélido da noite estava presente em qualquer lado que eu olhasse. As poucas pessoas, encasacadas, os vidros dos carros embaciados, as lojas fechadas nas quais apenas eram visíveis as grades ferrugentas, a condensação do vapor de água que expirava. Tudo isto, fazia daquela uma qualquer noite regular de inverno.
De mãos nos bolsos caminhava rapidamente tentando aquecer-me através do exercício. Mesmo assim, nesse frenesim, sentia os pés adormecidos devido ao ar que penetrava pelas sapatilhas primaveris e mal isoladas. As luzes amareladas dos fracos lampiões de rua deixavam o ar com um tom sépia idêntico às fotografias antigas e pálidas. É a cor que me faz lembrar os tempos dos avós em que todos eram felizes com pouco e alguns contentes com coisa nenhuma.
A cor, o frio e o deserto lívido de ideias, mas formigando de acções, fizeram acelerar o meu coração. Estavas caído no passeio de calçada e o teu sangue quente escorria por entre as pedras. Os gritos, em tanto desespero, eram bem audíveis, ecoavam pelas paredes circundantes e as ideias palpitavam a tanta velocidade que impediam os actos.
Coragem, onde foste? Vendo aquela personagem, tombada no solo, rodeada de pessoas em grande excitação foste logo abandonar-me. A força não apareceu e a estranheza da situação não causou mais do que o aparecimento do medo. Não fiquei para ver como terminou aquela cena. Outros mais aptos que eu conseguiram lidar com o sangue daquele inocente.

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