Esquecimento


Encontro hoje razões para me sentir triste quando vejo aquilo que me deixaram nas mãos enquanto olho o que me deixaram no coração. Não consigo deixar para trás as gavetas que ficaram armazenadas em sítios que pensava perdidos e esquecidos cada vez que tento mudar o meu caminho. Já tentei, já consegui, já voltei, já me perdi. As gavetas vêm e voltam com as coisas que vieram e fico sem saber onde guardar as que vêm, fiquei sem espaço, completo, da mesma maneira que sobem as águas do rio quando a chuva vem e transbordam sem querer saber de ninguém. A minha água já transbordou á muito das margens e agora só o sol a pode vir secar.
Guardei tudo o que podia nas minhas gavetas durante os dias em que julgava estar a construir as linhas dos meus desenhos. Guardei cores e fantasias e juntei lápis com canetas porque tudo sabia tão bem que nunca queria que acabasse. Juntei gavetas e gavetas para nunca mais as perder mas hoje são essas mesmo que quero deitar fora e não consigo. Não consigo abrir espaço para elas saírem, são grandes de mais para estarem guardadas em mim, quero que alguém as venha buscar e leve para longe.
Deixei, esqueci, deitei-me e apaguei a luz para dormir mas não consegui para de ouvir o barulho do silêncio. Era ensurdecedor e não me deixava adormecer. Fez-me levantar. Não conseguia abrir os olhos porque a luminosidade da escuridão era mais forte que a luz do sol. Fez-me fechar os olhos. Deixei de sofre durante o tempo que senti tudo controlado, mas dei por mim em pé, de olhos e gritando para alguém ouvir só que não estava ninguém e ninguém respondeu. Gritava mais alto e não conseguia parar quando a voz começou a doer e o som do grito ecoando na minha cabeça até que o grito parou porque esgotei as vontades que me faziam gritar. O grito parou, mas continuava a ouvir o som sem me aperceber de onde vinha quando notei que nunca tinha sido eu quem estava a gritar, tinha sido o meu coração a impedir-me de cair no esquecimento.